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A Avibras Aeroespacial S.A. é hoje o maior fabricante brasileiro de equipamentos de defesa. É também o único sobrevivente do extenso programa de modernização da indústria bélica nacional patrocinado pelo Governo Federal nos anos 70. A Avibrás foi fundada em 1961, em São José dos Campos (SP), onde também se localizam o ITA e o CTA, centros de excelência na formação de engenheiros e na geração de pesquisa aeronáutica que ao longo dos anos consolidaram o município como principal pólo aeroespacial do país. O primeiro produto da empresa foi o avião para treinamento básico Falcão; ainda nos anos 60 desenvolveu o primeiro propelente sólido sintético nacional para uso espacial, dando início a dois ramos de negócio nos quais se especializaria – a indústria química de propelentes e explosivos e a fabricação de mísseis militares. A transição para o ramo dos mísseis se deu em 1965, quando o CTA repassou à empresa a tecnologia do foguete Sonda, para pesquisas científicas, que acabava de desenvolver. Em 1976 a Avibrás passou a também atuar como fabricante de antenas parabólicas para comunicação via satélite.

Da mesma forma como aconteceu com todos os fabricantes de materiais de defesa do país, o grande crescimento da Avibrás ocorreu a partir de 1977, com o fim do Acordo de Assistência Militar com os Estados Unidos, vigente havia 25 anos e denunciado pelo Brasil em 11 de março daquele ano. A indústria brasileira já vinha experimentando na altura um proveitoso relacionamento com as instituições de pesquisa das Forças Armadas, que concebiam armamentos, aeronaves, embarcações e veículos modernos, repassando os projetos às empresas privadas para que estas os colocassem em produção, sem cobrança de custos nem exigência de pagamento de direitos ou royalties. A denúncia do Acordo com os EUA fortaleceu esse vínculo e assegurou inédita independência comercial do país no setor, com reflexos quase imediatos no mercado externo. Assim, aproveitando-se da conjuntura internacional favorável (e do apoio logístico do Itamaraty) em menos de três anos o Brasil se tornou um dos maiores fornecedores mundiais de material bélico.

A expansão da lista de produtos da Avibras foi permanente. Em 1977 iniciou a produção da linha de foguetes militares SBAT (ar-ar e ar-terra, desenvolvidos pelo CTA) e construiu os primeiros protótipos dos motores-foguetes X-20 e X-40 (respectivamente projetados pelo CTA e IME, com alcance de até 60 km) e do sistema Transit de recepção de navegação por satélite, para a Marinha. Em 1980 já trabalhava (sempre com o CTA) no desenvolvimento de mísseis multifásicos para lançamento de satélites artificiais e de mísseis teleguiados para uso militar com alcance de até 300 km. Em 1981 a empresa contratou com o Iraque a venda de US$ 500 milhões em mísseis, para isto tendo que expandir sua (segunda) unidade industrial de São José dos Campos. No ano seguinte foi a vez do projeto do lançador múltiplo 108-R, para 16 foguetes ar-ar e ar-terra.

Em 1983 a Avibras lançou seu primeiro veículo terrestre – o Astros II (Artillery Saturation Rocket System), apresentado em cinco variantes, compondo um sistema integrado de defesa antiaérea de alta mobilidade e precisão que viria a ser seu best-seller. A viatura principal é um lançador de mísseis terra-terra equipado com rampa móvel dupla – único equipamento de lançamento no mundo capaz de ser facilmente convertido para três calibres diferentes. Cada módulo aceita 32 foguetes calibre 127 mm, 16 calibre 180, um foguete calibre 300 ou um míssil tático TM (este com até 300 km de alcance). As quatro outras variantes são um sistema diretor de tiro compreendendo radar e computador para controle dos disparos, uma viatura remuniciadora com grua hidráulica, outra para comando e controle e um veículo de apoio para oficina e transporte de tropas.

As quatro versões tinham a mesma base – um caminhão 6×6 semi-blindado de 10 t (motor Mercedes-Benz V8 importado de 284 cv e 106 kgf.m a 1200 rpm), fabricado pela Tectran, empresa criada em 1982 pela Avibras para produzir veículos para transporte e uso civil. Montado sobre um chassi com longarinas de perfil U, o veículo tinha suspensão traseira em tandem (feixe de molas semi-elípticas invertido), caixa com cinco marchas com reduzida e bloqueio nos três diferenciais, direção hidráulica e controle interno da pressão dos pneus; a cabine era blindada. Em pouco tempo o Astros passou a ser um dos principais itens de exportação da empresa.

Universalmente reconhecido como um dos sistemas mais versáteis, eficazes e de maior precisão da categoria, o Astros II ainda se encontra em produção. Hoje na 6a geração (Mk5), é agora montado sobre o moderno chassi tubular de longarina central Tatra, de origem tcheca, com motor V8 turbo refrigerado a ar de 12,7 l, câmbio de 14 marchas à frente e duas a ré, tração integral e suspensão pneumática independente. À família foi agregada uma versão equipado como estação metereológica, com apenas dois eixos, configuração também assumida pela variante VCC, de comando e controle.

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Sistema Astros de defesa, grande sucesso mundial da Avibrás.

Em 1984 a Avibras passou a fabricar mais dois mísseis de moderna tecnologia: o Barracuda, primeiro antinavio brasileiro, e o Piranha, ar-ar com sensor infra-vermelho, que persegue o alvo atraído pelo calor do motor. Em 1985 lançou o Fila (Fighting Intruders at Low Altitude), sistema de contra-ataque aéreo de baixa altitude, também pela primeira vez fabricado no país. Estes equipamentos se juntaram aos demais produtos da Avibras, na época já com grande penetração no mercado mundial. As nações do chamado Terceiro Mundo, especialmente os países árabes, eram cada vez mais atraídas pelos armamentos brasileiros, não apenas pela qualidade e tecnologia agregada mas também pela simplicidade de concepção e manejo, flexibilidade e baixo custo. O mercado interno era (e é cada vez mais) restrito, e a indústria nacional crescia aceleradamente quase que com base nas vendas externas. No caso da Avibras, estas correspondiam a uma carteira de mais de um bilhão de dólares, respondendo por cerca de 90% do seu faturamento. Situação muito instável, pois, que se inverteria a partir de 1990, quando o setor perderia mercado e entraria em crise.

Foram muitos os fatores simultâneos que contribuíram para a retração da presença brasileira no mercado bélico mundial: sucessivos cortes de verbas das Forças Armadas (na prática, as financiadoras indiretas da indústria, por meio da cessão gratuita de tecnologias e projetos), situação muito agravada após a posse do governo Collor, em março de 1990; embargo internacional ao Iraque (maior cliente militar do Brasil); desmantelamento da União Soviética e das repúblicas do leste europeu e conseqüente mudança do foco da geopolítica norte-americana, da “Guerra Fria” para Israel e os países árabes; maior influência dos EUA sobre seus aliados da região (em especial Arábia Saudita e Kuwait), substituindo o Brasil como fornecedor de material bélico; maior agressividade dos fabricantes de armamentos europeus no mercado do Oriente Médio. Culminando tudo, a longa guerra de oito anos entre Iraque e Irã passou a requerer equipamentos cada vez mais sofisticados, que o Brasil já não estava preparado para fornecer.

Em pouco tempo faliram muitas empresas do setor, inclusive a Engesa, a maior delas. A Avibras entrou em concordata. Como via alternativa, a empresa aumentou a ênfase no fornecimento para o mercado civil (telecomunicações, informatização, autopeças), tanto diretamente como através de suas subsidiárias Tectran e Tectronic (posteriormente Powertronics). A diversificação sempre foi, aliás, uma das preocupações do Grupo Avibras. Em 1987, por exemplo, a empresa iniciou o projeto do que chamou Ônibus Urbano Brasileiro, um chassi com motor projetado pelo CTA com o apoio da Finep – um bicombustível a álcool e gás natural com 240 cv. Tanto o motor como os diversos componentes mecânicos seriam fabricados pelas próprias empresas do Grupo, que para isso pretendia construir uma linha de produção para dez mil chassis e vinte mil motores por ano. A crise chegou antes que os planos pudessem ser concretizados.

Quanto à área bélica, a situação se recuperaria aos poucos e só em meados da década de 90 seria desenvolvido um novo veículo automotor, o Astros Hawk, lançador leve de foguetes montado sobre um pequeno 4×4 fabricado pela Tectran e apto a operar com os novos mísseis Skyfire para alcance de até 12 km. Mais tarde, em 1999, montou um protótipo (ainda não industrializado) do que deveria ser o Astros III, com tração 8×8.

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O Sistema Astros é hoje composto por veículos de dois e três eixos com sete diferentes funções especializadas.

Em 2001, respondendo a um contrato firmado com a Malásia, a Avibras lançou a linha AV-VBL (Viatura Blindada Leve), veículo blindado 4×4 montado sobre chassi Mercedes-Benz Unimog U 2150L alemão alongado, trazendo motor diesel de quatro ou seis cilindros (150 ou 280 cv), caixa mecânica de oito marchas com bloqueio de diferencial, caixa de transferência e opção de tração 4×2. O veículo, proposto como equipamento de apoio para o Sistema Astros, pode ser configurado de diversas maneiras, combinando-se níveis de proteção, tipos de armamento, layout interno e acessórios. São três plataformas, com peso total entre quatro e doze toneladas e acomodação para três a doze tripulantes; já foram fornecidas versões VCC e PCC (viaturas de comando e controle) e posto meteorológico. Também são previstas variantes equipadas com radar de vigilância e preparadas para as funções de posto de observação avançado, ambulância, transporte de pessoal e reconhecimento.

Em 2003 foi lançado mais um blindado leve, o AV-VB4 RE Guará, desta vez sobre o chassi Unimog 4000, com motor turbo de quatro cilindros e 177 cv. Projetado em conjunto com o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento do Exército, tem 7,6 t e é de menor porte do que o AV-VBL; apresenta o mesmo excelente comportamento fora-de-estrada porém maior velocidade no asfalto e autonomia de 600 km. É um veículo extremamente moderno, com freios a disco nas quatro rodas, ABS e a tradicional suspensão por molas helicoidais do Unimog. Tem carroceria monobloco de chapa de aço soldada e, assim como o VBL, é apresentado em grande número de configurações, inclusive como porta-morteiros, lança-mísseis anti-carro, para operações urbanas e polícia militar. São muitos os equipamentos de série: ar condicionado, sistema de renovação de ar com filtragem, sistema de aquecimento e piloto automático, entre outros. Dentre os opcionais, proteção anti-minas, proteção contra contaminação química e bacteriológica, sistema de regulagem da pressão dos pneus, torreta giratória para metralhadora, sistema automático de extinção de incêndio, periscópio para visão noturna, gerador de energia e sistema de navegação GPS.

Com o Guará, a Avibras pretendia conquistar encomendas do Exército para fornecimento da Nova Família de Viaturas Blindadas sobre Rodas que deveria equipar a arma. As concorrências públicas tardaram; com vendas externas reduzidas em função da crise mundial, em julho de 2008 a Avibrás entrou em regime de recuperação judicial. Outra bem sucedida exportação para a Malásia e a efetivação de uma grande encomenda do sistema Astros II pelas forças armadas brasileiras permitiram dar novo fôlego à empresa, que por fim retomou a liquidez, em 2011, após a conversão de parte das dívidas com o Governo Federal em participação acionária (a operação tornou a União detentora de cerca de 1/5 do capital da empresa).

Novo veículo só seria apresentado em 2014, a viatura 4×4 Tupi, mostrada em abril às autoridades brasileiras. O protótipo foi preparado em apenas quatro meses com a colaboração da francesa Renault Trucks Defense (empresa do grupo Volvo), para participar de concorrência internacional lançada pelo Exército Brasileiro destinada à escolha do modelo de viatura blindada leve para sua Nova Família de blindados sobre rodas (que por fim deslanchou, também incluindo o 6×6 Guarani, fabricado pela Iveco). Na realidade, se tratava da “tropicalização” do modelo francês Sherpa Light Scout, de 8 t (capacidade para até 12 soldados ou 2,5 t de carga e autonomia de até 800 km), equipado com uma série de armamentos e equipamentos de defesa produzidos pela Avibrás. (O original francês possui motor diesel de quatro cilindros e 173 ou 215 cv, caixa automática, suspensão independente e freios a disco nas quatro rodas com ABS.)

A proposta da Avibras envolvia diversas versões: comando e controle, transporte, radar, ambulância, defesa antiaérea e patrulha armada. Caso vencesse a concorrência, a empresa se comprometia a fornecer o lote inicial, envolvendo o fornecimento de 186 unidades, com 32% de nacionalização, alcançado em meados de 2016 índice superior a 60%. Em 2015, Avibrás e Iveco foram indicadas finalistas no processo seletivo conduzido pelo Exército. Concluída a avaliação, em abril do ano seguinte, porém, a escolha recaiu sobre o modelo proposto pela firma italiana.

Com base na experiência adquirida com a preparação do Tupi, a partir do final de 2014 a Avibras procedeu à atualização do blindado Guará. Denominado Guará 4WS, seu protótipo foi oficialmente apresentado na LAAD 2016. Viatura para operações militares e policiais urbanas com capacidade para cinco tripulantes e respectivo equipamento, trazia chassi de projeto próprio, motor Cummins de 204 ou 250 cv, câmbio automático e tração, suspensão independente e direção nas quatro rodas. Haveria versão para transporte de tropas, com capacidade para dez soldados. Com índice de nacionalização significativamente superior ao do Guará anterior, possuía como elementos importados apenas o sistema de direção das rodas traseiras, o rádio militar e o computador de bordo.

Ainda na linha dos veículos terrestres, a Avibras está hoje envolvida no desenvolvimento e fornecimento de equipamentos para atender ao programa federal Astros 2020, cujo objetivo é dispor de uma frota de lança-mísseis com alcance de 300 km e as correspondentes viaturas de apoio. O primeiro lote foi entregue ao Exército em junho de 2014 – seis lançadores múltiplos AV-LMU, uma unidade remuniciadora e duas outras para posto de comando e estação meteorológica; a encomenda compreende 50 veículos, a serem produzidos até 2018. A base para todos eles será o caminhão Astros II sobre chassi Tatra, em sua versão mais atualizada (Mk6).

O catálogo da Avibras conta hoje com apenas um produto para o mercado civil, o Locotrator rodoferroviário, para movimentação de composições ferroviárias em pátios de manobra, equipamento desde 1985 fabricado pela subsidiária Tectran.

Último grande fabricante de material bélico nacional sobrevivente, a Avibrás voltou a passar por dificuldades financeiras, fruto da míngua de encomendas das Forças Armadas, do câmbio desfavorável e da fragilidade econômica do país. A pandemia da Covid, entre 2020 e 2021, agravou a situação, reduzindo em 85% a exportação de equipamentos, sua principal fonte de receitas. Em março de 2022 a empresa entrou com novo pedido de recuperação judicial (o anterior, de 2008, durou dois anos), demitindo 420 empregados de sua fábrica de Jacareí (SP), sem aviso prévio e pagamento de direitos – medida imediatamente suspensa pela Justiça.

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