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FIAT DIESEL | galeria

Os primeiros movimentos concretos para a instalação da Fiat no Brasil aconteceram em 1973, simultaneamente nos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais: neste, no mês de março, através do “acordo de comunhão de interesses” firmado com o governo estadual, que resultaria na sua grande fábrica de automóveis de Betim e teria como conseqüência, no início do século XXI, a liderança de mercado da marca no país. No Rio de Janeiro, poucos meses antes do acordo com Minas, o movimento decisivo se deu ao ser assumido 43% do capital da Alfa Romeo brasileira, sucessora da FNM, em troca do direito de utilizar suas instalações em Duque de Caxias para ali produzir uma linha de caminhões Fiat. Estavam previstos nove modelos, entre 5,5 e 26 t, com os quais a fábrica multiplicaria por cinco a produção, de 3.000 para 15 mil unidades mensais.

Com algum atraso, dada a dificuldade de atender ao índice mínimo de nacionalização de 80%, o primeiro caminhão Fiat nacional só foi lançado em julho de 1976. Era o médio 130, com capacidade para até 9,5 t e quatro opções  de entre-eixos (entre 2,93 e 4,87 m). Como os demais modelos da marca, tinha cabine avançada e tecnologia decididamente mais atualizada do que os antigos FNM. O motor de seis cilindros e 7,4 l dispensava 145 cv, com torque de 48 kgm; a transmissão contava com caixa de cinco marchas (as quatro últimas sincronizadas) e diferencial de duas velocidades; os freios hidropneumáticos tinham duplo circuito e a direção, assistência hidráulica.

Pouco depois foi apresentado o Fiat 190 E, aproveitando a cabine monobloco FNM, porém equipado com motor mais moderno (Fiat de seis cilindros, sete mancais, 13,8 litros, 256 cv, 97 kgm) e direção hidráulica; os demais elementos mecânicos eram FNM, inclusive a caixa de seis marchas com multiplicador (totalizando 12 velocidades). A terceira novidade do ano apareceu no X Salão do Automóvel, em novembro: o caminhão leve 70, com capacidade para 4,5 t e três versões (C, N, L, entre-eixos entre 3,0 e 4,4 m). O motor era um quatro cilindros de 4,9 l (cinco mancais, 90 cv e 31,0 kgm); tinha caixa de cinco velocidades (as quatro superiores sincronizadas), duas relações de diferencial, freios hidráulicos com duplo circuito, direção mecânica e suspensão (dianteira e traseira) com molas semi elípticas de duplo estágio.

Os três modelos ainda apresentavam elevado número de componentes importados, principalmente motores e elementos estampados das cabines; pressionada pelo governo federal a respeitar os limites de nacionalização, a Fiat chegou a estudar a utilização de unidades Cummins nacionais, cogitando mesmo na eventual compra da empresa, que atravessava um momento de vendas reduzidas e indefinição de mercado.

Em setembro de 1976, logo após lançado o seu primeiro caminhão nacional, a Fiat anunciou a aquisição do restante das ações da FNM ainda de propriedade da Alfa Romeo, passando a deter 94% do capital da companhia (os 6% remanescentes permaneceram de propriedade do governo federal). Até o final do ano os veículos mantiveram a marca FNM. Ao se iniciar 1977, porém, a linha de caminhões já era anunciada como Fiat, até que, em junho, a razão social da empresa foi oficialmente mudada para Fiat Diesel Brasil S.A.. Com isto, a marca FNM foi definitivamente descontinuada e a Fábrica Nacional de Motores, pioneira da indústria automotiva brasileira, passou a ser apenas um nome do passado. O automóvel Alfa Romeo 2300 continuou em produção em Duque de Caxias, até o ano seguinte, quando sua linha de fabricação foi transferida para a fábrica de Betim.

Em 1977 o 190 E foi melhorado e relançado como 190. A mudança externa mais visível foi na grade, muito simplificada. A acessibilidade foi facilitada, com mais um degrau, e os retrovisores foram ampliados; o volante diminuiu de diâmetro, mudaram faróis e limpadores e o conforto e acabamento interno foram melhorados. Sob o ponto de vista mecânico, mudaram motor (nova bomba injetora, alcançando 270 cv e 99 kgm de torque) e caixa (de nove velocidades, importada e não sincronizada). Fornecido com chassi curto, adequado para uso como cavalo-mecânico em operações de longo curso, o caminhão tinha capacidade de tração de até 50 t. Dispondo de dois leitos, era o único com cabine totalmente avançada da categoria. Na ocasião ainda se mantinha em linha um modelo um pouco menor – o 180 (o antigo FNM 180), com 193 cv e câmbio de oito marchas à frente e duas à re. Apresentado em cinco variantes, tinha capacidade para 22 t quanto equipado com terceiro eixo.

No mesmo ano saiu o primeiro chassis de ônibus da Fiat Diesel, o urbano convencional 130-OD, com motor dianteiro de 150 cv e suspensão por molas semi-elípticas – uma adaptação do caminhão 130. A partir de 1977, os caminhões Fiat Diesel passaram a trazer em local bem visível, no centro da grade, o logotipo Iveco – marca dos veículos comerciais do Grupo Fiat –, embora só cinco anos mais tarde o nome viesse a ter destaque na publicidade da empresa.

No ano seguinte, a Fiat Diesel procedeu a reajustes em sua gama, retirando de linha, com menos de dois anos de vida, os modelos 70, 130 e 130-OD, além do ex-FNM 210. Esta desmobilização precoce não foi favorável à empresa, que já vinha padecendo de críticas pela fraca rede de revendas e pela dificuldade de obtenção de peças, e apenas contribuiu para agravar a desconfiança do mercado frente aos seus produtos. Além disto, no Rio de Janeiro, sua imagem era cada vez mais negativa na imprensa, onde era freqüente o noticiário sobre a truculência de sua política de recursos humanos, de tensão e confronto com os operários, demissões constantes e ameaças de corte de direitos adquiridos. Embora discreto em resultados, ainda assim aquele seria o melhor ano da Fiat Diesel, com 5.073 caminhões e 487 ônibus (a título de comparação, no mesmo ano, a Mercedes-Benz produziu 45.726 caminhões e 13.050 ônibus, a Ford, mais de 18 mil caminhões, e a Chevrolet, numa fase especialmente infeliz, mais de 11 mil).

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Caminhão Fiat 190H, de 1979: nova cabine sobre a tradicional mecânica FNM.

Em lugar dos modelos descontinuados foram apresentados o leve 80, acompanhado do chassi de ônibus 80-OD, o médio 140 e o chassi 140-OD. Com novo para-choque e leve retoque na dianteira, o Fiat 80 (lançado no XI Salão do Automóvel) recebeu novo motor de 5,5 l e 100 cv e teve a capacidade de carga aumentada para 5,3 t; o 140, apresentado pouco antes, ganhou motor de 8,1 l com intercooler e 159 cv. A motorização dos chassis 80-OD e 140-OD seguia a dos caminhões.

Em 1979 a gama de caminhões médios foi acrescida do 120, ao qual foi aplicado o mesmo motor do 140, porém sem intercambiador de calor, limitando sua potência a 130 cv. Em novembro chegou o 190H – o mesmo 190, porém com nova cabine monobloco com suspensão independente, construída a partir de peças estampadas importadas da Itália. Na versão para cavalo-mecânico, o 190H teve o entre-eixos aumentado para 3,71 m (20 cm a mais), mantendo a mesma mecânica do modelo anterior, inclusive o motor aspirado de 270 cv. Em 1979 a produção foi um pouco menor – 5.545 unidades; a partir daí, porém, a situação da empresa só veio a se deteriorar, sendo fabricados apenas 4.724 veículos em 1980.

Em 4 de maio de 1981 teve início uma longa greve geral na fábrica, por um ano de estabilidade no emprego e pela readmissão de 250 empregados demitidos dias antes. Apesar de julgada legal pelo Tribunal Regional do Trabalho, a Fiat negou-se a negociar com os grevistas; a intransigência da empresa, a presença constante da polícia, agressões dos seguranças da companhia, conflitos com vítimas nos portões da fábrica e a demissão por justa causa de mais 49 operários após um mês de greve não esmoreceram o movimento, que teve a duração de 42 dias.

Buscando reagir à queda de vendas, a Fiat Diesel apresentou diversas novidades no XII Salão do Automóvel, em novembro, a começar pela introdução de variantes com 3º eixo nos dois modelos médios (120 N3 e 140 N3), que com isto atingiam, respectivamente, capacidades máximas de carga de 13,9 e 16,6 t e de tração de 19 e 25 t. Também o pesado 190H ganhou adaptações (quinta-roda de fábrica para os cavalos-mecânicos e terceiro-eixo, com chassi e suspensão reforçados, para receber betoneiras de 10 m³), enquanto que o leve foi reestilizado e também recebeu a opção de 3º eixo. Com a denominação 80S, ganhou nova grade, faróis retangulares montados no para-choque e painel e volante com novo desenho; o radiador foi deslocado para posição mais protegida. Por fim foram colocadas em teste versões 6×4 dos modelos 140 e 190H, o primeiro com suspensão traseira em balancim e o último em tandem.

A produção caiu mais uma vez: 3.803 veículos em 1981, apenas 1.439 para o mercado interno. Diante da crise que se formava, a opção da matriz foi transferir a Fiat Diesel, a partir de 1982, para administração da Iveco, que de imediato demitiu mais 600 empregados. Procurando recuperar espaço, a empresa preparou seu primeiro caminhão turboalimentado, com atraso de anos frente à concorrência. Apresentado oficialmente na 7ª Festa do Carreteiro, em julho, em Curitiba, o 190 Turbo desenvolvia 306 cv e 135 kgm de torque; a anacrônica caixa não sincronizada do 190H foi substituída por uma com engate rápido. Especial atenção foi dada à cabine: carpete, cortinas, relógio eletrônico com despertador, rádio-toca fitas, antena embutida, bancos com encosto para a cabeça, teto solar, limpador com temporizador, tacógrafo e até barbeador. O lançamento, porém, chegou tarde demais. Em 1982 a produção se resumiu a 875 caminhões e 17 chassis de ônibus. A perda de algumas encomendas externas levou a mais demissões: 585 metalúrgicos em maio, 100 em agosto, mais 592 no ano seguinte, quando somente 456 veículos foram construídos (àquela altura, o efetivo de pessoal já estava reduzido a um terço). Em 1984, caminhões médios e chassis de ônibus foram retirados de linha e a produção foi ainda menor: 419. O quadro de pessoal, com 420 empregados, já representava menos de 10% do de dez anos atrás.

Em junho de 1985, ante a falta de perspectivas de crescimento do mercado de caminhões a curto prazo, a administração do Grupo Fiat decidiu concentrar esforços na fábrica de Betim (que acabara de lançar o moderno Uno), determinando o encerramento das atividades da Fiat Diesel. A produção foi imediatamente suspensa, sem nenhuma consulta prévia a autoridades federais, estaduais ou municipais nem aviso à rede de revendedores. A maior parte das máquinas foi rapidamente negociada com a Cummins, Eaton, Krupp e Brasinca. Em 1992 as instalações de Xerém foram vendidas à Ciferal. Desde a fundação da FNM até o encerramento da produção, exatos 75.863 veículos comerciais saíram da fábrica fluminense: 57.330 caminhões pesados, 9.129 médios, 6.756 leves e 2.648 chassis de ônibus.

A Iveco voltaria ao Brasil no início do novo século, mas desta vez operando fábrica especialmente construída em Minas Gerais. Por vários anos a Fiat foi acusada de descumprimento da obrigação de fornecimento de peças de reposição para a frota remanescente.





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