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CAIO NORTE | galeria

Subsidiária nordestina da Caio, criada em 1962, oficialmente denominada Companhia Americana Industrial do Ônibus do Norte. Em associação com a Villares, a Caio acabara de vencer licitação para o fornecimento de 130 trólebus para a cidade do Recife. O custo elevado e as dificuldades logísticas para o transporte dos veículos completos de São Paulo, onde seriam fabricados, se mostrou um problema inesperado. Incentivada pelo governo estadual, no ano seguinte a empresa decidiu instalar fábrica própria em Cabo de Santo Agostinho, que tanto se encarregaria da montagem dos ônibus elétricos como do suprimento de carrocerias para ônibus diesel para os mercados das regiões Norte e Nordeste.

O golpe militar de 1964, a prisão e a cassação do mandato do governador do Estado Miguel Arraes e a instabilidade política que se seguiu levaram ao cancelamento da encomenda dos trólebus e à suspensão temporária do projeto. Lastreada em recursos da Sudene e do BNB – Banco do Nordeste, no final do ano seguinte a planta industrial (em Jaboatão dos Guararapes, e não mais no Cabo) teve a construção retomada, sendo finalmente inaugurada em 28 de outubro de 1966. Tinha capacidade para 48 unidades/mês.

Foi lento o ritmo de produção inicial: 15 carros em julho de 1967, totalizando 100 unidades em outubro daquele ano. A abrangência regional, contudo, foi rápida: ao completar meio ano de operação já haviam sido fornecidas carrocerias para 23 operadores nordestinos, nos estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Alagoas.

Inicialmente foram fabricados modelos urbanos Jaraguá, em geral sobre chassis Mercedes-Benz LP. Os veículos diferiam levemente daqueles produzidos em São Paulo, em estilo, pela agregação de pequenas grades de alumínio perfurado, na dianteira, para favorecer a ventilação do salão. Em 1968 foi introduzido em linha o modelo Bela Vista, dotado de teto curvo, já não utilizado na versão paulista, da qual também diferia pela ampla e vistosa grade dianteira. (A versão mais moderna, com teto plano, chegaria no final do ano seguinte.) Ainda em 1968 foi encarroçada a primeira plataforma nacional da Magirus-Deutz e, no ano seguinte, o primeiro rodoviário com chassi Scania, respectivamente fornecidos para a Empresa São Judas Tadeu, de Cabo, e para a Empresa Santana, de Feira de Santana (BA). A 1.000a carroceria foi entregue em junho de 1970 – o que correspondia à média mensal de quase 23 carros.

Em 1971 a matriz completou 25 anos: com a marca de 14.000 unidades fabricadas, detinha o posto de maior indústria de carrocerias da América Latina e quase monopolista no mercado de São Paulo, com mais de 95% dos fornecimentos. Em comemoração do aniversário – que coincidiu com o 5o ano do início da produção na Caio Norte -, lançou o rodoviário Jubileu 25, para chassis de motor dianteiro Mercedes-Benz LPO, a ser fabricado na unidade nordestina.

Sem a sofisticação e ousadia estética do futurista Gaivota, a nova carroceria não carecia de equilíbrio em suas linhas, sendo marcantes as janelas laterais com cantos em ângulo vivo, a faixa de vinil revestindo a primeira coluna e avançando até o teto, o vinco percorrendo as laterais, o grande para-brisa dianteiro, o para-brisa traseiro inteiriço e as quatro esbeltas lanternas traseiras. Tinha toalete, 40 poltronas reclináveis, luzes individuais, divisão para o motorista e bagageiro passante na traseira.

Naquela altura a produção da Caio Norte já ultrapassara 1.300 unidades e suas carrocerias supriam operadoras de 14 diferentes estados brasileiros, atendendo desde Belém do Pará até Paranaguá, no Paraná. A diversidade de modelos e mercados continuou crescendo: em 1973 entrou em linha o denominado Bela Vista 74 – o conhecido urbano com novo estilo dianteiro – e, em 1974, o micro Carolina; em 1976 chegaram os urbanos Gabriela e Ipanema (com estrutura de duralumínio) e, no ano seguinte, o rodoviário Corcovado, todos eles já sem nenhuma mudança visual frente às versões do Sul.

Veículos especiais também eram fornecidos por encomenda, como a transformação de 20 Chevrolet Veraneio em viaturas policiais para a Secretaria de Segurança de Pernambuco, em 1973, e dois anos depois, ônibus para o transporte de tropas da PM/PE, com capacidade para 120 homens cada. (Em estranha política de diversificação, a Caio Norte também foi importante fabricante local de carrinhos de mão…)

A Caio Norte chegava então à sua melhor fase, com 400 carrocerias produzidas em 1973, 30% a mais do que as 307 do ano anterior, e o recorde de 495 unidades no final de 1975, correspondendo à média de pouco mais de 41 por mês. Em março de 1977, novo recorde de 70 unidades no mês. A empresa era praticamente monopolista em Pernambuco, onde detinha 90% do mercado e era a principal fornecedora da maioria dos operadores do Recife, inclusive da empresa pública CTU. Para atender à crescente demanda, chegou a adquirir quatro carretas para o transporte de chassis 0 km diretamente da fábrica da Mercedes-Benz, em São Bernardo do Campo (SP). Em 1979, em paralelo com a implantação de sua nova grande fábrica em Botucatu (SP), a Caio iniciou a ampliação do parque industrial de Jaboatão.

Naquele mesmo ano, porém, a recessão econômica daria seus primeiros sinais, em pouco tempo transformando-se em grave e demorada crise. Já em 1979, 190 empregados seriam demitidos em Jaboatão. Ainda assim, favorecida por bem sucedidos esforços de exportação, inclusive pela Caio Norte, a Caio iniciou a década de 80 mantendo a produção em níveis aceitáveis – em torno de 500 unidades mensais – 200 em São Paulo, 200 no Rio e 100 em Pernambuco. No final de 1980 iniciou a fabricação do moderno urbano Amélia. A produção já caíra, no entanto, para 60 carros por mês; a ampliação da planta nordestina se arrastava, tendo a conclusão postergada para o ano seguinte.

Em 1982 a demanda externa sofreu drástica redução; agravada pela recessão do mercado interno, que já vinha de mais de dois anos, tornou a crise especialmente aguda. No final do ano a ociosidade da Caio se elevou a 60%. A produção na Caio-Norte foi provisoriamente suspensa e, em São Paulo, mais de 900 empregados demitidos. Em março de 1983, na matriz, sob ameaça de novas dispensas foi deflagrada greve pela estabilidade no emprego. Radicalizando sua postura, duas semanas depois a Caio simplesmente fechou a fábrica de São Paulo, demitindo todos os 450 operários e transferindo o restante da produção para Botucatu.

A truculência foi estendida a Pernambuco, onde houve 257 demissões em janeiro e outras três centenas no mês seguinte, reduzindo a força de trabalho a apenas 120 empregados, frente aos 713 do ano anterior. Parte do estoque foi transferidos para Botucatu, assim como o atendimento das encomendas. Em fevereiro, a única linha de produção mantida ativa – de carrinhos de mão – ocupava somente 40 trabalhadores. Em comunicado publicado na imprensa, a Caio culpava “as autoridades de transportes todo o País, nas esferas municipal, estadual e federal“, por não terem tomado “qualquer medida para contornar ou evitar [as] graves dificuldades econômicas e crescente descapitalização [vividas] pelas empresas de ônibus urbanos“.

Suspensa por algumas semanas, a produção foi retomada em ritmo lento, não mais atingindo os níveis históricos. Seriam poucos os fatos marcantes a partir de então: em dezembro de 1988 o lançamento do urbano com estrutura de alumínio Vitória e, no final de 1994, a produção da 10.000ª carroceria. Mas os dias da Caio Norte estavam contados. Em 1996 as operações de fabricação foram encerradas, sendo mantidas apenas a oficina e a área comercial, que também não duraram muito tempo. Com o apoio de forças políticas locais, o então vice-presidente da República, o pernambucano Marco Maciel, ainda tentou convencer a administração da Caio a assumir uma posição intermediária – de simples montagem de carrocerias com componentes “importados” do Sul, sob sistema CKD -, mas mesmo esta débil proposta foi descartada.

A crise fatal logo alcançaria também a matriz. Com mais de cem milhões de reais em dívidas, em dezembro de 2000 a Caio teve a falência decretada. Rapidamente a Justiça autorizou o arrendamento da massa falida, assumida pela Induscar, firma especialmente constituída para esse fim pelo maior operador de ônibus de São Paulo. O contrato de arrendamento incluía o uso das instalações de Botucatu e da marca Caio; fora da negociação, a Caio-Norte foi desativada.

 





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